terça-feira, 29 de novembro de 2011

A condição humana

Para Hannah Arendt, em seu livro “A condição humana”, o termo público refere-se a dois fenômenos similares, porém não perfeitamente idênticos. Em primeiro lugar, tudo que é público pode ser visto ou ouvido por todos. Para nós a aparência – aquilo que é visto e ouvido por nós mesmos- constitui a realidade. Associado ao fato de que a realidade ocorre de algo que possa ser visto e escutado, até mesmo as forças da vida íntima – paixões, pensamentos – caracterizam uma espécie de existência duvidosa e obscura, até que sejam transformadas de modo a se tornarem adequadas à aparição pública; transformação decorrente na narração de histórias e na transposição de experiências individuais. Todas as vezes que se falam em coisas que só podem ser experimentadas na privatividade, esta retoma uma esfera na qual assumirá uma espécie de realidade, que independente de sua intensidade, jamais poderiam ter tido antes.
O sentimento mais intenso que conhecemos, é ao mesmo tempo, o mais privado e menos comunicável; não apenas por ser tratar da única experiência que somos incapazes de adequá-la a uma exposição pública, mas também por nos privar da percepção da realidade, a ponto de ser facilmente esquecida.
Visto que a nossa percepção da realidade depende da aparência e assim, da existência de uma esfera pública da qual possam emergir da treva da existência, até mesmo a meia-luz que ilumina a nossa vida privada e íntima deriva, da luz muito mais intensa da esfera pública, porém há coisas que não suportam a luz da constante presença de outros na esfera pública. O que não significa que as questões privadas sejam irrelevantes, pelo contrário, muitos assuntos relevantes só podem sobreviver na esfera privada.
O que a esfera pública considera irrelevante pode ser tão contagiante que pode ser considerado como modo de vida, sem que o caráter essencialmente privado seja alterado.
Em segundo lugar, o termo público significa o próprio mundo, comum a todos e diferente do lugar que nos cabe dentro dele. Este mundo, não é idêntico à natureza como espaço limitado para o movimento dos homens. A esfera pública atribuída como mundo comum, reúne-nos na companhia uns dos outros e evitam conflitos; o que torna tão difícil a convivência em sociedade de massas é fato de que o mundo entre elas perdeu a força de mantê-las unidas, de relacioná-las e separá-las.
 Para manter uma comunidade destituída de interesse num mundo comum, é conhecido apenas um princípio que encontra um vínculo entre os homens, forte o bastante para substituir o mundo. A edificação da caridade em todas as relações humanas proposta pela antiga filosofia cristã de Agostinho corresponde claramente à experiência geral do amor, que é ao mesmo tempo diferente deste último por ser algo que se interpõe entre os homens. Embora o vínculo entre as pessoas seja incapaz de criar uma esfera pública própria, é adequado ao princípio fundamental cristão de guiar por este mundo um grupo de pessoas essencialmente situadas fora dele.

Livro "A condição Humana" de Hannah Arendt.
(Por Larissa Pereira Fraga)

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